Reportagem de ISTOÉ flagra Paula
Rousseff e Rafael Covolo, filha e genro da presidente afastada, utilizando
veículos pagos pelo governo para cumprir compromissos pessoais
Como tantas outras Paulas filhas deste País, Paula levanta cedo da cama com o tilintar do despertador. Não raro, o marido, Rafael, já está de olhos abertos. Pela manhã, ela mantém uma rotina nada estranha à maioria das pessoas de classe média. Vai ao cabelereiro, faz compras para abastecer a despensa de casa, reserva uns minutos para o pilates e uma ida rápida à clínica de estética, e, eventualmente, dá uma passadinha no pet shop. Depois de almoçar, leva o filho à escola. À tarde, dirige-se ao trabalho, obrigação já cumprida pelo marido de manhã. Como tantas outras Paulas filhas deste País, Paula seria apenas mais uma brasileira se não carregasse em sua assinatura o sobrenome Rousseff.
Perante à lei, filhos de presidente da República são iguais a
todos. Ombreiam-se aos demais cidadãos. Não deveriam merecer distinção ou
receber tratamento especial, salvo em alguns casos de excepcionalidade. Mas a
filha de Dilma, que hoje se encontra afastada, ou seja, nem o mandato de
presidente exerce mais, não se constrange em cultivar uma mordomia ilegal.
Diariamente, Paula Rousseff Araújo desfruta de uma regalia. A máquina do Estado
a serve, bem como ao seu marido e filhos. As atividades narradas acima, como
uma frugal ida ao cabelereiro, ao pilates e ao pet shop, são realizadas a bordo
de um carro oficial blindado com motorista e segurança. Em geral, um Ford
Fusion. Acompanha-os invariavelmente como escolta um Ford Edge blindado com
dois servidores em seu interior, um deles um agente de segurança armado. O
mesmo se aplica ao genro de Dilma, Rafael Covolo, e aos dois netos. No total,
oito carros e dezesseis pessoas integram o aparato responsável pela condução e
proteção da família da presidente afastada. Trata-se de um serviço VIP.
Quem banca essa estrutura é o Gabinete de Segurança
Institucional da Presidência. Ou seja, o contribuinte. Nas últimas semanas,
reportagem de ISTOÉ flagrou os carros oficiais entrando e saindo do condomínio
Vila de Leon, zona sul de Porto Alegre, onde moram os familiares de Dilma, para
levá-los a compromissos do dia a dia. A rotina dos Rousseff segue um padrão. O
6 de julho dos descendentes da presidente afastada não foi muito diferente dos
dias anteriores. Às 18h30, uma quarta-feira, o Fusion blindado escoltado pelo
Ford Edge também à prova de balas trouxe a família de volta ao lar, depois de
transportá-la para uma série de atividades pessoais. No dia seguinte, às 9h da
manhã, os mesmos carros já estavam de prontidão na porta da casa da filha de
Dilma para mais uma jornada por Porto Alegre. No dia 12/07 às 13h40, Rafael
Covolo, marido de Paula, foi buscar um dos filhos na escola. Como de praxe, com
o carro oficial. Um automóvel pago com dinheiro público os escoltou até o
retorno para casa. O Fusion levava a placa IVF – 3267 (normalmente é esta ou a
IVG – 1376) e o Edge IUF – 3085. Se consultados nos registros do DETRAN, os
prefixos figurarão como “inexistentes”. Sim, são placas frias ou vinculadas,
inerentes aos chamados carros oficiais de representação.
6 de julho. 18h30 –
Carros oficiais deixam os Rousseff em casa, um condomínio na zona sul de porto
alegre
A mordomia de Paula Rousseff e Rafael Covolo, além de constituir
inaceitável privilégio, é também uma benesse totalmente ilegal. A legislação é
clara. Reza o artigo 3º do decreto 6.403 de março de 2008, baixado pelo
ex-presidente Lula: os veículos oficiais de representação – como os que
transportam a família de Dilma – são utilizados exclusivamente pelo presidente
da República, pelo vice-presidente, pelos Comandantes da Marinha, do Exército e
da Aeronáutica e pelo Chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas e por
ex-presidentes da República. A única exceção que permitira que filhos de
presidente desfrutassem desse privilégio é se fossem usados os chamados carros
oficiais de transporte institucional. Com um condicionante: “se razões de
segurança o exigirem”. Não é o caso, definitivamente. Primeiro porque carro
institucional não possui escolta armada nem placa vinculada ou fria, como os
veículos que servem a família de Dilma. Ainda de acordo com instrução normativa
do Contran, veículo institucional é identificado com a expressão “governo
federal” na cor amarelo ouro e tarja azul marinho. Nenhum dos carros usados por
Paula e Rafael Covolo exibe esta inscrição. Mesmo que eles utilizassem esse tipo
de veículo, haveria uma outra barreira de cunho legal.
Os Rousseff só poderiam ser enquadrados nessa situação
totalmente excepcional se: 1) Comprovassem a existência de riscos à sua
integridade física e 2) Fossem familiares de presidentes em exercício. Quer
dizer, hoje o deslocamento da filha, genro e netos de Dilma a bordo de veículos
oficiais compõe um mosaico de irregularidades. Se a mamata já seria
desnecessária e ilegal com a presidente Dilma no pleno exercício do cargo, em
se tratando da chefe do Executivo federal afastada a regalia ofertada à Paula
Rousseff, Rafael Covolo e filhos afronta sobejamente a legislação em vigor. Por
ironia, o decreto que estabelece regras para a utilização dos carros de governo
foi reeditado com pequenas alterações por Dilma em outubro do ano passado, com
o objetivo, segundo ela, de “racionalizar o gasto público no uso de veículos
oficiais”. A racionalização, claro, não alcançou sua família, como se nota.
Os serviços de transporte e segurança dos Rousseff em Porto
Alegre estão a cargo de uma empresa terceirizada contratada pelo Gabinete de
Segurança Institucional da Presidência da República: a Prime Consultoria e
Assessoria Empresarial, conforme documentos aos quais ISTOÉ teve acesso. Todo
mês, a Prime encaminha ao Palácio do Planalto um relatório de abastecimento dos
veículos. A última nota foi emitida no dia 1º de julho. Na prestação de contas
estão listados os veículos, suas especificações, bem como as respectivas placas
vinculadas, sem registro no DETRAN, e os motoristas responsáveis por atender
aos familiares da presidente afastada na capital gaúcha. Em junho, por exemplo,
foram gastos só com combustível R$ 13,8 mil. Os familiares de Dilma não
precisariam de carros oficiais para o cumprimento de suas tarefas diárias.
Paula Rousseff é procuradora do trabalho no Rio Grande do Sul. Entrou no
Ministério Público do Trabalho em 2003 por meio de concurso público.
Atualmente, recebe salário de R$ 25.260,20. Para quê a mordomia com dinheiro
público? Por que o genro de uma presidente afastada precisa usar carro oficial
para a execução dos afazeres cotidianos?
Na política, se não forem estabelecidos limites, necessários à
liturgia do cargo, a família tem grande potencial para gerar constrangimentos.
Sobretudo porque eventuais privilégios desfrutados por filhos dizem mais sobre
os pais do que os próprios herdeiros. No Brasil, um País de oportunidades
desiguais, regalias a parentes de políticos chamam muita atenção e, em geral,
são consideradas inaceitáveis e despertam indignação e sensação de injustiça na
população. Quando a prática é ilegal, a situação se agrava. Por constituir
vantagem ilícita a terceiros e atentar contra os princípios da administração
pública, o episódio em questão pode até render um processo contra Dilma por
improbidade.
Procurado por ISTOÉ, o Gabinete de Segurança
Institucional da Presidência afirmou que “permanece realizando a segurança da
Presidenta Dilma e de seus familiares, de acordo com o disposto no inciso VII
do Art 6º da Lei Nr 10.683, de 28 de maio de 2003”. O problema é que o referido
“amparo legal” não prevê o uso de carros oficiais para fazer o transporte da
família da presidente afastada. Em tese, apenas a escolta para segurança seria
permitida.
Diz o inciso VII do Art 6º da Lei Nr 10.683: ao
Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República compete zelar,
assegurado o exercício do poder de polícia, pela segurança pessoal do
Presidente da República, do Vice-Presidente da República e respectivos
familiares, dos titulares dos órgãos essenciais da Presidência da República e
de outras autoridades ou personalidades, quando determinado pelo Presidente da
República, bem como pela segurança dos palácios presidenciais e das residências
do Presidente da República e do Vice-Presidente da República.
Três dias antes de deixar a Presidência, em 2010,
Lula fez questão de assegurar aos seus filhos a dispensável regalia do
passaporte diplomático. Revelada pela imprensa, a esperteza engoliu o dono. Em
novembro de 2013, a Justiça determinou a apreensão dos passaportes e o
recolhimento dos mesmos pelo Itamaraty. Depois do impeachment de Dilma, o tema
voltou à baila com a apimentada discussão sobre eventuais mordomias a que a
presidente teria direito afastada do cargo. Uma ação civil pública questionou o
uso por Dilma de aviões da FAB. A Justiça até permitiu o deslocamento com os
jatos da Força Aérea Brasileira, desde que custeados pela própria mandatária
afastada. Recentemente, apoiadores do PT se cotizaram para bancar as viagens.
Pela trilha da carruagem, hoje já abóbora, haja crowdfunding militante (a
popular vaquinha) para sustentar os privilégios de petistas e congêneres que
ainda insistem em se refestelar com as benesses do Estado.
“É ilegal, mas eles usam mesmo assim”
Na quinta-feira 14, ISTOÉ conseguiu fazer contato
com um dos responsáveis pela frota de carros oficiais que serve a família da
presidente Dilma Rousseff em Porto Alegre. Com medo de retaliação, ele pediu
para não ser identificado.
ISTOÉ – Quantos carros oficiais a família de Dilma tem à
disposição?
São oito carros blindados de fábrica. Quatro para o transporte e mais quatro que fazem a escolta armada. É um serviço VIP. No carro oficial e no veículo de escolta há um motorista e um segurança. No total, são quatro pessoas envolvidas para cada dupla de carros.
São oito carros blindados de fábrica. Quatro para o transporte e mais quatro que fazem a escolta armada. É um serviço VIP. No carro oficial e no veículo de escolta há um motorista e um segurança. No total, são quatro pessoas envolvidas para cada dupla de carros.
ISTOÉ – Desde quando a filha, o genro e os netos da presidente
afastada contam com o serviço de transporte e segurança pago pelo governo?
Há pelo menos cinco anos. São carros de representação com placa vinculada ou placa fria para não serem identificados. Se você consultar no DETRAN, aparece como placa inexistente.
Há pelo menos cinco anos. São carros de representação com placa vinculada ou placa fria para não serem identificados. Se você consultar no DETRAN, aparece como placa inexistente.
ISTOÉ – Além de se tratar de uma mordomia, a utilização de carros
de representação por familiares de presidente da República é ilegal.
Sim. É ilegal. Mas eles usam mesmo assim. Eles até poderiam usar uma escolta. Não sou PMDB nem nada. Mas, por exemplo, a Marcela Temer (atual primeira-dama) usa a escolta para segurança. É normal. Mas sabemos que, quando morava sozinha em São Paulo, ela ia para compromissos pessoais com o carro dela. Não com carro oficial. Isso que a família de Dilma faz contraria a lei.
Sim. É ilegal. Mas eles usam mesmo assim. Eles até poderiam usar uma escolta. Não sou PMDB nem nada. Mas, por exemplo, a Marcela Temer (atual primeira-dama) usa a escolta para segurança. É normal. Mas sabemos que, quando morava sozinha em São Paulo, ela ia para compromissos pessoais com o carro dela. Não com carro oficial. Isso que a família de Dilma faz contraria a lei.
ISTOÉ – Nossa reportagem apurou que a filha de Dilma leva o filho
à escola, vai para o pilates, pet shop, clínica de estética e até ao
cabelereiro com os veículos pagos pelo governo. O genro também usa os carros
oficiais para atividades semelhantes. O sr. confirma essa informação?
Confirmo. Os carros oficiais os levam para atividades do dia a dia.
Confirmo. Os carros oficiais os levam para atividades do dia a dia.
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